Teologia do livro de Rute

Sob as asas de YAHWEH: a Teologia do livro de Rute
Por Ida mara Freire
No módulo Teologia do Antigo Testamento o professor Antonio Neto nos apresentou, o tópico a era davídica, dentre quais se configura o livro de Rute, composto de apenas quatro capítulos. A essência e o propósito do livro são apontados em Rute 2:12, quando Boaz ora para que Rute, uma moabita, seja recompensada por sua benevolência, sob as asas de Javé. A presente resenha busca apresentar a relevância da leitura do livro de Rute, enfatizando seus atributos literários, teológicos e existenciais.
O reconhecido poeta e escritor alemão Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832) descreveu o livro de Rute como a mais encantadora obra completa em miniatura. Para alguns estudiosos trata-se de uma narrativa fascinante, envolvente, comovente e historicamente significativa sendo considerada a joia da coroa do Antigo Testamento. Poucas são as histórias da Bíblia contadas do ponto de vista de uma mulher, no livro de Rute não somente uma mulher é a protagonista como o mundo da história é um mundo da mulher, onde o escritor dá atenção para os valores e sentimentos femininos. Certamente, Boaz, em seu papel de parente próximo e resgatador figura-se como uma magnífica silhueta do Mestre, antecipando em muitos séculos a sua graça redentora. Deste modo a história de Rute exalta a virtuosidade feminina e o caráter masculino.
No que diz respeito ao estilo literário, verifica-se como o autor do livro de Rute adota uma estrutura denominada quiasmática, trata-se de um recurso literário que consiste na repetição de uma série de elementos em ordem inversa pela reiteração ou paralelismo de ideias, palavras, atos ou personagens, que depois convergem para um ponto central.
A teologia do livro de Rute pode ser identificada no seu universalismo, na concepção da retribuição e no sentido do sofrimento. Nas palavras de Walter C. Kaiser Jr. o livro ensina: “sobre a bênção de Deus, a recompensa para os atos de benevolência (hesed), a inclusão dos gentios nas bênçãos do evangelho – até mesmo na linhagem prometida de Davi –, e as obras providenciais de Deus” (2011:160). O livro é ancorado no tema da promessa que alinhava a teologia do Antigo Testamento. Se nos livros Josué e Juízes, o foco da revelação está na terra que Deus prometeu aos descendentes de Abraão; no livro de Rute, o foco passa para a semente que Deus prometeu, que viria da tribo de Judá para governar o povo de Deus. Como descreve Thomas L. Constable: O modo como Deus deu um herdeiro para Elimeleque que cumprisse, em parte, a promessa relativa ao descendente-rei de Judá constitui a fascinação da história de Rute e a grande prova da soberania de Deus. Tantas situações aparentemente impossíveis tiveram de ser superadas para que o leitor se identificasse prontamente com Noemi no seu desespero inicial no capítulo 1. Mas Deus incrivelmente fez que a sua vontade acontecesse“. O livro de Rute revela muito sobre o plano de Deus e traz uma contribuição importante para a compreensão de como Deus trata as pessoas. Uma característica do relacionamento de Deus com as pessoas é a sua preferência em trabalhar com indivíduos e através de indivíduos que as pessoas consideram material improvável. Rute, por exemplo, era mulher, era estrangeira, era membro de uma nação inimiga dos israelitas. Além disso, era viúva e pobre. O elemento chave foi a sua fé. A confiança no Senhor venceu todas as outras limitações e qualificou-a para o uso de Deus (2009: 129).
Como as asas de Javé se estende até nós hoje? É interessante observar com Scott Atran, que embora na contemporaneidade cientistas e intelectuais têm predito o declínio da religião. O contrário se mostra, ao notar o aumento do fervor religioso ao redor do mundo. Uma das questões para isso acontecer está no fato da ciência tratar o ser humano como um elemento acidental do universo, enquanto na religião, ele é o elemento central. A ciência não parece ser muito apropriada para lidar com a ansiedade existencial das pessoas, incluindo a morte, a decepção, a solidão ou desejo de amor ou justiça. Pois, ela não diz o que deve ser feito, somente o que pode ser feito. A religião viceja porque ela é dirigida para os anseios mais profundos das pessoas.
O livro de Rute inspirou a escritora sul-africana Marlene van Niekerk a escrever a sua obra ficcional intitulada “Agaat”. Na análise dessa obra a estudiosa Chery Stobie examina como Van Niekerk desafia o leitor a encontrar um sentido de benevolência na prática religiosa e na sociedade, engajando criativamente com a difícil situação do outro. Nessa perspectiva de encontro, sugiro que tenhamos em mente e também no coração a oração do personagem Boaz: “O Senhor retribua o teu feito, e seja cumprida a tua recompensa do SENHOR, Deus de Israel, sob cujas asas vieste buscar refúgio.” Rute 2: 12
Referências:
A Bíblia da Mulher: leitura, devocional , estudo. 2a. ed. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2009.
A Bíblia Tradução Ecumênica Brasileira. São Paulo: Loyola e Paulinas. 1995
Bíblia de Estudo Plenitude. Baueri, – SP- Sociedade Bíblica do Brasil, 2002
Constable, Thomas. Uma teologia de Josué, Juízes e Rute. In: Zuck, Roy B. Teologia do Antigo Testamento. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembleias de Deus. 2009
Kaiser, Walter C., Jr. O plano da promessa de Deus: teologia bíblica do Antigo e Novo testamento. Trad. Gordon Chown, A. G. Mendes, São Paulo: Vida Nova, 2011.
Study Bible, English Standard Version. Wheaton, Illinois: Crossway, 2008.
Stobie Cheryl, ‘Speaking with Our Spirits’: The representation of religion in Marlene Van Niekerk’s Agaat. In: Duncan Brown. Religion and Spirituality in South Africa. New Perspectives. Scottsville: University of KwaZulu-Natal, 2009.