Por Ida Mara Freire(*) Foto de Diogo G. Andrade Espetáculo “Aurora” com Egon Seidler
“As pessoas que não têm capital e nem poder, têm tarefas, poucas tarefas, e podem passar a vida inteira cumprindo as mesmas tarefas, o que é profundamente alienante do ponto de vista do desenvolvimento humano. O trabalho [criativo] é uma forma de aprender, de crescer, de amadurecer, e essas oportunidades a economia solidária oferece a todos, sem distinção”, explicita o economista Paul Singer e a décima edição do Múltipla Dança Festival Internacional de Dança Contemporânea, que ocorrerá em vários locais de Florianópolis, entre 20 a 27 de maio.
A leitora e o leitor devem estar indagando como os cortes nas verbas da cultura afetam a apreciação da dança? Vejamos, Marta Cesar e Jussara Xavier, diretoras do Múltipla Dança, consideram uma façanha a realização dessa edição do Festival, diante de condições tão hostis, que exigiu uma reelaboração estrutural por parte da equipe, ações de solidariedade e parceira com: Fundação BADESC, SESC, UFSC, UDESC, Dança em Foco, Grupo Cena 11, e Caixa Federal, colaborações que permitem o evento acontecer.
Jussara Xavier celebra a manutenção da característica marcante do festival: a multiplicidade, que este ano aborda os confrontos cotidianos, a valorização da singularidade humana e a possibilidade de mudar o mundo, afirmando o compartilhamento de ideias, a intensidade do corpo e a alegria inesperada da dança que se quer dançar. Multiplicidades expressa na manifestação da diferença do espetáculo “Convite ao Olhar” da Cia. de Dança Lápis de Seda; na oportunidade de ouvir e de ver Inês Bogéa, autora de mais de 40 documentários sobre dança; na territorialidade que convida o público para dançar nos parques, nas dunas da Lagoa e seguir os rastros da pergunta: O que é estar aqui? Tudo oferecido de modo gratuito para o público em geral, e especialmente o infantil, com o espetáculo “Para todos os Seguintes”, da Key Zetta e Cia de São Paulo.
Vale conferir como o Múltipla Dança 2017 aproxima-se de uma prática de economia solidária. Seja com a estreia do espetáculo Protocolo Elefante do Grupo Cena 11, viabilizado, em parte, com fundos arrecadados no site de financiamento coletivo Catarse; seja com a participação colaborativa de artistas e grupos catarinenses como: Egon Seidler, Daniela Alves, Karina Collaço, Anderson do Carmo, Cristiano Prim, projeto Corpo, Tempo e Movimento e Entropia – Experiências Artísticas. É pelo esforço cooperativo destes convidados que a dança ganha vida e se multiplica em ações que fazem refletir em diálogos, no qual Ana Alonso, é uma das interlocutoras que propõe pensar a relação entre a forma artística, sua poética e sua política. As experiências da dançarina auxiliam perceber como interligação, pertencimento e apropriação, conhecimento e aproveitamento dos recursos humanos e materiais, podem ser elementos chaves no processo de criação de economias questionadoras do status quo. Venham! Participem criativamente desse exercício de arte solidária.
(*) Pós-doutorado em dança, Universidade da Cidade do Cabo, África do Sul, Texto Publicado no Caderno Plural do Jornal Notícias do Dia, 19/05/2017.